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Terça-feira, 27.08.13

"Eurídice" de José Lins do Rêgo

do Rego, José Lins. 1987(?). Eurídice. 1987(?). Lisboa: Livros do Brasil

 

Li este livro de 2 a 27 de agosto de 2013, um verão particularmente marcante. Fi-lo a partir de um exemplar da Biblioteca Municipal de Mondim de Basto, edição portuguêsa cuja data não consegui precisar, mas que estimo ser do ano de 1987, por indícios encontrados em páginas digitais. De acordo com a biografia do autor, tal como vem sendo editada na Wikipédia, o romance terá sido escrito em 1947.

O que me levou a requisitá-lo, dois dias após a inauguração do edifício, tão emblemático para mim, foram as páginas em que o autor, escrevendo em nome próprio, se refere ao "caderno" da escrita, como se fora um diário de anotações das suas próprias memórias. Revi-me nesta atitude de gostar de registar os acontecimentos de uma vida e intrigou-me, precisamente, esta opção pela "voz activa" na escrita de uma ficção.

O romance está organizado em curtos, ainda que numerosos (46) capítulos, de três a quatro páginas cada um. Divide-se em duas partes, cada uma das quais correspondente às vivências do autor num particular espaço físico e afetivo: "Uma Casa da Rua Tijuca" e "Eurídice". Se a primeira é a casa do nascimento, infância e adolescência, vividas em condições traumáticas, a segunda é a da fatídica paixão vivida na "Casa de Catete", alojamento do autor enquanto estudante de Direito.

Cedo se percebe, aos primeiros capítulos, que o autor se encontra num presídio e, um pouco mais adiante, que o seu crime terá sido um homicídio. Com este engodo, vamos seguindo a narrativa pausada do narrador que nos guia, passo-a-passo, como sem pressas, pela memória dos acontecimentos que o levaram a cometer o crime com que termina o livro.

É um livro datado, no sentido em que se passará na segunda metade da década de 30 do século passado, já que um importante personagem da segunda parte do livro, é um activo militante do integralismo brasileiro. Mas não é de um romance histórico que se trata, antes de um romance que explora a complexa vivência emocional de Julinho, o narrador, desde o seu despertar para a vida, no seio de uma família de mulheres em desiquilíbrio sentimental ao assassinato da amada, Eurídice, por um conjunto complexo de razões, do foro da psicanálise. É, também neste sentido, um romance "moderno" já que contemporâneo, da vida e da obra, de Sigmund Freud. A sua originalidade parece estar ainda no facto de poder tratar-se de um romance que explora a psicologia humana o que, seguramente, não seria vulgar nos autores da época, muito menos de língua portuguêsa. Estas observações porém, carecem de estudo para revisão ou melhor fundamentação.

Não apenas porque o li num verão particularmente difícil, para nós enquanto família, este livro revelou-se tão surpreendente quanto incomodativo. Não sei que marcas me deixará. Não sei se alguma vez voltarei a ler Lins do Rêgo mas, por fim, considero ter sido uma experiência gratificante já que muito raramente consigo ler um livro em tão "curto" espaço de tempo - 28 dias - de um autor cuja nacionalidade nos é tão afim.

Relações entre Lins do Rêgo, Machado de Assis (autor de "Dom Casmurro"), ou mesmo autores mais recentes e mais populares como Jorge Amado, ficam por explorar, como por explorar está a história do Brasil e da literatura brasileira. O que quero dizer é que Lins do Rêgo é, definitivamente, um autor da América Latina que junto à galeria, algo eclética, de autores já lidos como Garcia Márquez, Laura Esquível ou Luís Sepúlveda.

A tudo isto, espero poder voltar.

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por JNobre


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