Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
uma bibliografia de trazer por casa
Versão original: Sábado, 18 de Julho de 2009
Sim, a primeira ideia é essa: escrever sobre os livros que “permanecem” abertos, cuja "leitura" não concluí. Mas também sobre os que um dia foram “abertos” sem que jamais os tenha realmente “fechado”. Fechar-se-á, alguma vez e em definitivo, um livro? É bem mais provável que a sua marca nunca nos abandone, como o perfume de um relacionamento. Ler tem, aliás, os seus perigos: perda de tempo, fadiga dos olhos, alienação intelectual, degradação mental ou, nos casos mais extremos, demência! Não por acaso, de tempos a tempos, os livros são, eles mesmos, o combustível da pira redentora, acesa pelos detentores da verdade, para livrar a humanidade dos males da cultura! Felizmente, haverá sempre livros abertos e muitos mais por abrir. E esses que alguma vez abrimos permanecerão para sempre “abertos” na mente de quem como nós arriscou um dia virar-lhes o rosto, a partir da lombada.
Por fim, acho que haverá ainda espaço e oportunidade para editar textos que não chegarão a ser um livro fechado porque permanecem abertos na formulação do que vou escrevendo.
Nos intervalos das nossas vidas, é bom parar para pensar. A sós ou com um Amigo que pode ser Alguém ou alguma coisa, como um Livro. Mas a leitura, a reflexão e a escrita são coisas indissociáveis por isso, dificilmente consigo ler sem ter por perto um caderno onde faça apontamentos das ideias que surgem ou das passagens de leituras que pretendo fixar.
Aliás, como está escrito no sub-título do “mondim: leituras”, tudo pode ser lido, isto é, tudo é susceptível de interpretação pelo que, escolher uma leitura, reflectir sobre o que se lê e escrever sobre isso é constituir um repositório pessoal de ideias e princípios susceptíveis de influenciar o comportamento do leitor e, de modo menos evidente, dos que o rodeiam. Decidi-me pois a registar, de onde a onde e de quando em quando, resultados pessoais das leituras que faço, dos livros abertos que se vão espalhando pela casa ou pelo meu local de trabalho. Poderia chamar-se “bibliografia”, mas não poderia deixar de ser “de trazer por casa” seja na sua dimensão seja nos seus propósitos.
Já há alguns anos, ouvi (na rádio) o jornalista Luís Delgado afirmar ter, regularmente, cerca de 25 livros em estado de leitura. Quando o ouvi pela primeira vez, isto dizer, como que se apagou em mim a má-consciência que há anos me atormentava, por não ser um leitor disciplinado. Já então, como agora, é muito comum começar a leitura de um livro, desde a primeira página (!), com grande entusiasmo e determinação sem que vislumbre quando e se alguma vez o terminarei. Na maior parte dos casos, ler um livro pode levar-me anos. Os livros estão a meu lado, como um amigo ou um familiar, todos os dias, independentemente das horas, boas ou más. Viajam comigo (o que chega a indispor uma parte da família) e fico incomodado quando os julgo perdidos quando inadvertidamente pousados aqui ou ali. Chego a admitir que pode haver em mim uma pulsão que me leva a lamentar pelo fim de uma relação e pela nostalgia dos começos pelo que, adiar o fim de um livro, é adiar o fim de uma viagem a dois – eu e o autor – com todo o universo de paisagens, ambientes e personagens que essa viagem nos proporciona. Quando se trata de ensaios, livros de estudo, então a viagem é iniciática. Aprendo com a experiência do outro, sempre diferente, sempre único, sempre fascinante.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.